Existem conceitos profundos cujo uso indiscriminado acaba tornando-os clichês. Dentre eles: propósito, coach, mindset e geração de valor.
Há que se conferir pragmatismo aos conceitos. Com base na análise Value for Money, trarei 3 exemplos de como o advogado pode gerar efetivo valor ao cliente.
Geração de valor e análise “Value for Money” (VfM)
Gera-se valor quando o resultado medido é superior à soma dos insumos. Dentro de uma organização, isso ocorre com: a) a distribuição de produtos/serviços em rede, que escalam as vendas; b) o fortalecimento da marca, que aumenta a disposição do cliente em pagar pelo produto/serviço e; c) o desenvolvimento de operações mais eficientes, que reduzem custos.
A análise Value for Money (VfM) traz métricas claras para avaliar a redução de custos em atividades ou projetos empresariais, com base em 3 dimensões: economia (qualidade e custo), eficiência (resultados por unidade de insumo) e eficácia (alcance dos objetivos desejados).
Na advocacia, a geração de valor ao cliente muitas vezes é explícita, como na concessão de um habeas corpus na área criminal (há valor maior do que a liberdade?) ou no resultado favorável de ações judiciais indenizatórias.
Em outras especialidades, como na advocacia consultiva, nem sempre o valor gerado é óbvio. Os 3 exemplos de atuação abaixo buscam dar concretude ao conceito, ao mostrar que o advogado quando atua como um exímio gestor de riscos é essencial ao cliente.
Prevenção de risco real e tangível
É fato que um contrato bem desenhado e que leve em consideração os interesses das partes e a alocação dos riscos envolvidos é de vital importância. No entanto, o cliente pode e deve pedir dados que demonstrem: a) qual o risco protegido; b) qual a probabilidade dele efetivamente acontecer e; c) qual sua real dimensão.
Tome-se o exemplo de um advogado que sugere a inclusão, na política de privacidade de um portal de e-commerce, de uma trilha detalhada e auditável de ciência e de consentimento do usuário no uso dos dados que ele fornece. Qual o efetivo valor dessa inclusão?
No caso, o advogado comprovará a pertinência da sugestão ao informar o cliente de que, a partir da vigência da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a inexistência de controle de consentimento do usuário pode sujeitar a empresa ao pagamento de multa diária de até 2% de seu faturamento até o limite de R$ 50 milhões, além da publicidade dessa infração – diminuindo assim o valor da marca – e do bloqueio e eventual eliminação de todos os dados coletados pela empresa, o que deve impactar sensivelmente o negócio do cliente.
Uma vez tangibilizado o risco, fica claro ao cliente a imprescindibilidade e a importância do serviço do advogado.
Negociação de créditos de devedores duvidosos
A inadimplência é fato inerente às empresas. O risco do não pagamento está presente em toda atividade econômica, e há formas sofisticadas de analisar a chance de que uma dívida seja efetivamente paga.
As dívidas com alta probabilidade de não pagamento podem ser provisionadas, gerando, contabilmente, a Provisão para Devedores Duvidosos (PDD).
Para esse tipo de dívida, a mobilização de recursos da empresa – atuação do jurídico e do financeiro internos – pode aumentar aquele passivo, o que tornaria mais racional simplesmente abrir mão daquele crédito, como no exemplo:
Nesse exemplo, verifica-se que é financeiramente desvantajoso para a empresa cobrar os valores que ela tem direito. No entanto, a contratação de um escritório de advocacia por menos de R$ 30.000,00 (valores inadimplidos x probabilidade de pagamento) é uma operação adequada sob a perspectiva financeira, com base na análise VfM.
Assessoria na escolha do regime tributário
No Brasil, costuma-se dizer que o regime tributário está vinculado ao tamanho da empresa: simples nacional para as pequenas empresas, lucro presumido para aquelas que faturam entre R$ 3.6 milhões e R$ 78 milhões e lucro real para as que faturam acima desse valor.
Esse raciocínio é errado e, por vezes, a escolha irrefletida e dissociada da realidade do negócio gera prejuízo à empresa. O advogado que fornece assessoria nesses temas gera valor concreto e imediato ao cliente empresarial.
Tanto o Simples Nacional quanto o Lucro Presumido têm a mesma premissa: o governo ficticiamente indica qual é o lucro da empresa, independentemente do lucro efetivo obtido.
O regime de tributação pelo lucro real, como sugere o nome, avalia efetivamente o lucro que a empresa teve em determinado período de apuração, tornando, por assim dizer, mais justa a relação entre o Estado e a empresa. Se a empresa não tem lucro, não paga imposto. Além disso, pode compensar prejuízos de anos anteriores com lucros atuais, pode incluir a depreciação de seus bens da empresa e, ainda, pode ser enquadrada em determinados incentivos ficais, como aqueles relativos à inovação previstos na “Lei do Bem” (Lei nº 11.905/05).
Muitas empresas que fabricam produtos e que têm investimento em maquinário, ainda que com faturamento modesto, têm uma tributação menor no regime do lucro real.
Mesmo empresas de serviços podem ter ganho efetivo no regime do lucro real. Empresas de tecnologia, numa estrutura mais sofisticada, podem ser duplamente beneficiadas pela “Lei do Bem” – aumentar seu valuation e diminuir sua base de cálculo tributável –, mas somente se estiverem no regime do lucro real. Esse tema será tratado em artigo próprio.
O bom advogado conseguirá propor a alteração no regime tributário quando ela for mais benéfica, e comprovará matematicamente sua contratação, mostrando que a diminuição da tributação será muito maior do que os honorários que ele cobra.
É certo que muitas vezes o advogado gera valor ao cliente. A provocação deste artigo é para que se evite apenas pronunciar o mainstream “gerar valor”, mas comprová-lo. É um ferramenta de mão dupla: capacita o cliente para questionar a necessidade e pertinência da contratação do advogado e viabiliza que o advogado comprove sua importância.